sábado, 22 de dezembro de 2018

bom dia sol
que já entrou no quarto cedo
e disse: dia de solstício
sorriso e prece matinal
por um bom dia, bons dias
que virão
e viraram um ano.

dias bons de aprendizado
justiça, revisão, libra
qual a mentira do meu coração?

uma menina, uma mulher, um menino
azul, rosa, 
coisa de homem, coisa de mulher
ele parece um garoto novo, bobo
inseguro, ciumento, 
cheio de dúvidas sobre si
sabe que é viado
desviado 
do caminho que lhe foi traçado
e nesse corpo a lembrança 
vem no trejeito desengonçado
de ser de estar de pensar e sentir
isso tudo ali
com ela do lado 
me falando de paixão por um outro
que não tem as mesmas dúvidas
e dívidas com o corpo fálico
que eu, 

um nome, um sexo, um órgão genital
um corpo que não aguenta quase nada
um copo cheio de cachaça
a metade de um cigarro aceso
uma língua falante 
que vive presa na boca 
com medo 
medo do falo, medo da fala
e ainda a mesma imagem
da menina nova boba
insegura, ciumenta
cheia de dúvidas e dívidas sobre si
sabe que é viada
desviada 
da certeza que lhe foi ensinada

e ainda a mesma lembrança
passou a vida toda rimando
amor com dor e torpor
e ainda não sabe onde é que tá
a resposta, o segredo, 
a responsa em se ser
sem ter que se rotular
sem ter que desamar um lado
pra amar o outro

sempre capenga na vida
vou aleijando esse corpo que não me aceita
tira um pedaço daqui, um dali
como se arrancar passado
resolvesse o pecado

se o teu olho ou tua mão te faz pecar
arranca fora!
mas e se fosse o pulmão?
e quando é o coração?
arrancar o pulmão é tirar meu ar
arrancar meu coração
é tirar minha única possibilidade de amar
aí ele vem e me conta o segredo

que pecar mesmo é não se amar
não se aceitar, 
não se conhecer, não se entender
não se acolher... 
e eu venho e me acolho
acolho hoje todas as minhas
dúvidas e dívidas sobre mim
sobre quem eu sou
e não é definição nenhuma
que vai me fazer pecar
se eu de fato puder me amar!