quando eu deixo vir essa letra,
essa palavra que não se parece,
[aliás, se parece sim um pouco com a minha]
a caneta pesa
as vista embaralha
frio e calor ao mesmo tempo
até tontura
e não tem nada a ver com idade
comodidade pros que preferem
rótulos ao invés de identidade
é antiga
a antiga entidade
a mais velha em mim
um corpo rasgado
tentando caber aquilo que não cabe
não me cabe em lugar nenhum!
oráculo da perfeição
é verdade o seu standard?
é de seda o seu cedro?
lesma, lerda
lenda viva o seu caderno
os meus rabisco
uma cereja no bolo
e olhas curvo pra mim
olhas torto pra mim
eu não me guio por vista
não ligo mais pro jeito que vc me olha
ou pelo menos sigo
tentando não achar tão importante
a intensidade opostamente dúbia
que perpassa meu ser
me acende
me intensifica
e o todo vira rotina
e a rotina vira tudo
isso de sentir tão fundo
machuca
mesmo quando é só com
escuta
é que tanta gente tinha tanta coisa pra falar
e eu tinha tanta coisa pra ouvir
e quanto mais me condeno
desejo ser tudo, menos eu!
dona de casa de cultura,
sem nenhuma cultura
senão aquela de erguer as mãos
e bater palmas ...
era o máximo que eu me permitia
ah pq se eu quisesse viver o que eu queria
ninguém suportaria
eu não suportaria
e eu acabei não me suportando
logo eu,
a integridade de um todo que se constitui em partes infinitas do meu ser,
de um grande SER
infinitivo...
sem definição de gênero
essência
eu, uma demonia,
carrego um não me suportar absurdo
que essência minha tá no falo
falo que eu não tenho
fala que me foi negada
desde o templo
desde o tempo em que eu fugia
de desejar compartilhar o meu corpo e a minha existência com uma outra mulher
isso era pecado!
e dos piores
mas no dia que outros ventos
me sopraram em direção ao mar
eu sabia:
não existia nada que eu vivesse
que não fosse eu!
o mar é tão grande!
transbordando
em mim, de mim!
essência carrego
quando em terra fértil
trago o falo da subsistência
raiz em busca de água
existência
daqui, seiva
essência carrego desses encontros
quando a música
é o meu encontro
é o nosso encontro
acho que isso me constitui
acho q isso me expande fundo
lá onde eu encontro água
tão fundo que é difícil chegar
tem que tá sempre decidindo
entre medo e coragem
medo de que?
dessa estupida que sou!
pega estupidez, coloca no bolso e sossega
até quando for pra ela
a hora de acender vela
de preferência num bolso perto do peito
estoura em represas
energia
hidra
deusa da água
deusa da lua
deusa do amor
do útero: o primeiro cárcere mania
que eu encontrei na vida
o primeiro sentido remorso
culpa
medo e esperança
do espelho vivo quebrar
tenho medo e esperança
do espelho quebrar
e olha lá!
oiá soprou o vento!
hei! olha lá!
oya soprou e sopra o vento
que nem sempre
tem que ter verbo e microfone
e falo não é só anatomia!
quem é que não vive isso?
se não vive, viva!
pra experimentar o que é viver
... essa mistura
esse lá e cá
que nem a minhoca se movimentando
vales e colinas
a luz e a sombra
sangue e neve
no ar e no fundo do mar
no paraquedas e no mergulho
tontura ou falta de ar
nem sempre é só conforto se encaixar
encaixei, me encaixei
mas ainda nunca cabia direito
que pontas eram essas?
que pontas são essas que nunca se encaixam?
que pontes são essas?
pedaços vivos de uma existência antiga
que se multiplica em vozes, gritos, suspiros,
lamentos, cantos, cânticos sufocados, miudinhos
cantos com pontas afiadas
que me mastigam a garganta,
mas não saem!
inadequada
não me encaixo em canto nenhum
inadequada
imperfeita
única! única desse jeito que só eu!
ninguém mais vai beliscar os dedos
ou fazer cara de boba
ou não saber o que dizer
como eu
só eu faço isso é um jeito engraçado
que eu tanto odiei
mas agora não tem mais paredes!
lancei me fora das caixas de adequação
sem paredes, só horizontes
(citando o bandeira) e lembrando que
bandeira
standard
símbolo.... eu firmo no amor!
eu falo
e falar não é só verbo e microfone
e verbo também pode ser amor
e microfone? aberto, por favor!
eu falo quando me movimento
quando vou lá e cá
e encaro a verdade que quem eu sou