terça-feira, 10 de março de 2020

eu num 8 de março e só!
só porque ando descobrindo q solidão
também vem com autonomia
que solidão às vezes é o unico jeito de sobreviver nesse mundo sendo eu
nem mulher, nem bandeira, nem de ninguem
um corpo q no meio da multidão
até parece fragil
parece pequeno
parece inseguro
parece q precisa de defesa
mas quem sabe de mim? 
as vezes nem eu!
não me coloque apenas num bolo
num côro, num rotulo
nem é um dia que me define

se não pode me aceitar assim como sou
não me aceita de jeito nenhum
eu não vou me encaixar
nem fazer nada pra você ficar melhor
com a minha presença
não tem q ficar falando baixinho com os outros
pra saber como é que me chama
se virei homem, se ainda sou mulher
eu só queria que você olhasse no fundo dos meus olhos e me visse
queria que você
tentasse perceber que eu sou bem mais
que uma saia, que uma gravata
nunca me sentia feminina 
quando vinham as definições
e nunca quis ser 
o macho que machuca pra ser macho
e pra ser sincera
eu me olhei mais dentro
foi pelo olhos da minha gata
que só mostrava as unhas afiadas 
quando queria
parecia mais comigo
do que qualquer homem ou mulher

continuo me achando esquisita
deshumana despida de gênero
porque pra saber gênero dos não humanos
a gnt se entorta, se esforça pra ver ovos, peitos
e às vezes a gente nem liga
tipo a xanaia e a nina
que a gnt co'essa mania de generoralizar
foi lá e disse: é menina
mas não eram. eram gatas machos
e que mais uma vez nos ensinaram

por que é tão importante o gênero
pra você me respeitar?
por que é tão importante o remo
se o vento pode nos guiar?

ontem, no dia internacional na mulher
não fui a nenhuma marcha
e não fiz nada pra gritar nossas mortes
não sou uma mulher dos números
e não decoro estatísticas, mas nem precisa

porque pra mim é definição de gênero q mata
acho que eu não sou tão feminista
o quanto queria
porque se o meu corpo, meu som, meu tempo de fala não pode ser respeitado 
pra quê sororidade?
alguém pode me explicar essa palavra?

eu sempre gostei das marchas
elas me inspiram ao grito
mas poxa! quando a gente abriu a janela
e gritou, o que mais doeu foi gênero achar que a gnt ta vendo fatima bernardes demais

gênero me mata
não sou a mulherzinha que você queria
não sou nem a que eu fingia
eu só queria poder isso:
saia e gravata, batom e calção
e que isso fosse tranquilo
que isso fosse respeitado 

mas nesse 8 de março
eu aqui, deitada na minha rede só
tentando eu mesma dar liberdade pra esse corpo todo machucado 
e é sério!
tanto envolvimento tanto texto tanta teoria
tanta palavra bonita
e eu aqui só! tentando entender
que não é homem nem dever
não é genero que me define
e pela primeira vez me sinto menos impostora
só eu sendo tão eu pra definições
grilhões se arrebentando, um a um
não quero elo, não quero consolo
nem explicação.